Comando Vermelho já controla a venda de bebidas nas praias de Fortaleza (CE)

Jefferson Lemos
A facção exige que vendedores de água de coco, cervejas e outros produtos comprem exclusivamente de um depósito controlado por seus membros, sob ameaça de morte (Divulgação/PMF)

O que antes era cenário de lazer e cartão-postal do Ceará, hoje se transforma em território de medo e coerção. Após uma série de ataques violentos a empresas provedoras de internet, o Comando Vermelho (CV) agora mira o comércio informal na Avenida Beira-Mar, principal ponto turístico da capital cearense. A facção exige que vendedores de água de coco, cervejas e outros produtos comprem exclusivamente de um depósito controlado por seus membros, sob ameaça de morte.

A estratégia de dominação não é nova. Entre fevereiro e março de 2025, cinco empresas de internet foram atacadas em Fortaleza, Caucaia, Caridade e São Gonçalo do Amarante. Os criminosos incendiaram veículos, destruíram fiações e dispararam contra sedes empresariais, forçando provedores a repassar parte da mensalidade dos clientes à facção. Em Caridade, 90% da população ficou sem conexão.

Agora, o mesmo modus operandi se repete na Beira-Mar. Ambulantes foram obrigados a entrar em um grupo de WhatsApp chamado “Grupo das Bebidas”, onde membros da facção — identificados como “PH” e “Netão Marley” — ditam regras e ameaçam quem ousa comprar de fornecedores independentes. “Se desobedecer, vai ser espichado no calçadão”, teria dito um dos criminosos, segundo relatos de vendedores que preferem o anonimato.

Paraísos dominados: turismo do Nordeste cai nas mãos das facções

Expansão silenciosa e lucrativa

O avanço do CV e do Primeiro Comando da Capital (PCC) pelo Nordeste é parte de uma expansão nacional que transforma paraísos turísticos em centros de operações do tráfico. Praias como Jericoacoara (CE), Porto de Galinhas (PE) e Pipa (RN) estão sob domínio de facções que impõem regras, monitoram policiais e faturam alto com a venda de drogas a turistas. Em Jericoacoara, um adolescente foi assassinado em dezembro de 2024 por ter sido confundido com membro de facção rival.

Esses destinos, embora mantenham aparência de tranquilidade para não afastar turistas, vivem sob o controle de “tribunais do crime”, olheiros armados e ameaças constantes aos moradores. A presença das facções é facilitada pela estrutura precária de segurança pública e pela alta circulação de dinheiro, especialmente em vilas com festas e turismo de luxo.

Fronteiras abertas, segurança falha

O avanço do crime organizado é alimentado por falhas na política de segurança pública. O Brasil possui mais de 16 mil km de fronteiras, muitas delas sem demarcação ou vigilância adequada. A entrada de armas pesadas, como fuzis, e toneladas de drogas pelas divisas estaduais e fronteiras internacionais ocorre com facilidade, abastecendo facções em todo o território nacional.

O modelo de enfrentamento tem se mostrado ineficaz. O monopólio do tráfico continua a recrutar jovens, corromper agentes públicos e expandir seu poder econômico.

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Cidades em queda livre

O resultado é visível nos índices de violência. Maranguape (CE), por exemplo, liderou o ranking nacional de homicídios em 2024, com 79,9 mortes por 100 mil habitantes. Fortaleza, antes símbolo de cultura e turismo, agora figura entre as capitais mais perigosas do país.

Enquanto o governo federal insiste em planos que não enfrentam as causas estruturais do problema, facções seguem redesenhando o mapa do crime no Brasil — agora com foco nos pontos turísticos, onde o lucro é alto e a presença do Estado, quase nula.

O paraíso virou refém. E o Brasil, espectador.

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Jefferson Lemos é jornalista e, antes de atuar no site Coisas da Política, trabalhou em veículos como O Fluminense, O Globo e O São Gonçalo. Contato: jeffersonlemos@coisasdapolitica.com.br
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