‘Negro honorário’: homenagem que virou polêmica volta ao centro do debate no STF

Jefferson Lemos
Durante o julgamento, Fux relembrou a homenagem e destacou sua trajetória de mais de duas décadas dedicada ao tema (Reprodução)

O desembargador federal Willian Douglas trouxe à tona, em suas redes sociais, os bastidores da homenagem concedida ao ministro Luiz Fux pela Educafro. Segundo ele, o título de “negro honorário” foi pensado como forma de reconhecer o engajamento de Fux na luta contra o racismo. “Achei o nome muito feliz e agregador”, afirmou Douglas, lamentando que a honraria tenha sido extinta após críticas internas ao movimento negro.

A declaração ganhou repercussão justamente no dia em que o STF realizou uma sessão histórica sobre violações de direitos da população negra. Durante o julgamento, Fux relembrou a homenagem e destacou sua trajetória de mais de duas décadas dedicada ao tema.

O julgamento no Supremo

Na sessão desta quarta-feira (26), o STF analisou a ADPF 973, ação que denuncia a omissão do Estado brasileiro no combate ao racismo estrutural. Em seu voto, Fux defendeu o reconhecimento de um “estado de coisas inconstitucional”, o que obrigaria a União a elaborar um plano nacional de enfrentamento ao racismo.
O ministro justificou sua postura firme em julgamentos relacionados ao tema:

“A intuição e a voz do coração, a ênfase e a rebeldia diante de determinados julgados decorrem do meu senso de Justiça”, disse, ressaltando que sua independência judicial é “insindicável”.

A trajetória de Luiz Fux

Fux recordou momentos simbólicos de sua atuação, como a entrega do Troféu Raça Negra à filha de Martin Luther King e à esposa de Nelson Mandela. Também citou homenagens recebidas da Educafro e da Fundação Palmares, além de sua convivência com o ativista Abdias do Nascimento, que o inspirou a aprofundar estudos sobre racismo.

O ministro fez questão de destacar o legado de Joaquim Barbosa, primeiro negro a presidir o STF, a quem chamou de “um negro de cultura ímpar, que elevou a Corte no plano da legitimidade democrática”.

A polêmica do título

Willian Douglas relatou que apenas três pessoas receberam o título de “negro honorário” antes de a Educafro suspender novas concessões. Para ele, a decisão foi resultado de uma visão radical que, em vez de aproximar, acabou afastando aliados da causa.

“Esses títulos são honoríficos, registram contribuições a uma causa ou lugar. São formas de reconhecer serviços prestados”, escreveu Douglas, comparando a honraria a títulos de cidadania concedidos por municípios.

Debate em aberto

O episódio expõe uma tensão recorrente dentro do movimento negro: como equilibrar reconhecimento e identidade sem cair em apropriação ou exclusão? Enquanto Fux defende que sua trajetória legitima sua atuação, críticos argumentam que a vivência negra não pode ser simbolicamente transferida.

No entanto, o julgamento no STF marca um passo decisivo: pela primeira vez, a Corte pode obrigar o Estado brasileiro a adotar medidas estruturais contra o racismo. A polêmica sobre o título de “negro honorário” apenas reforça a urgência de um debate que vai além das homenagens — trata-se de enfrentar desigualdades históricas e garantir direitos.

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Jefferson Lemos é jornalista e, antes de atuar no site Coisas da Política, trabalhou em veículos como O Fluminense, O Globo e O São Gonçalo. Contato: jeffersonlemos@coisasdapolitica.com.br
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