O chefe da Divisão de Investigações sobre Crimes contra o Patrimônio (Deic) da Polícia Civil de São Paulo, Clemente Calvo Castilhone Junior, revelou um retrato preocupante sobre a profissionalização do crime como resultado da impunidade.
Oito em cada 10 brasileiros tremem ao ver uma motocicleta se aproximar
Segundo o delegado, a impunidade tem contribuído para o aumento do latrocínio, transformando o crime em profissão.
O quadro já é realidade em São Paulo e reflete desafios semelhantes no Rio de Janeiro.
Quadrilhas organizadas, redes de logística sofisticadas, violência e reincidência criminal são elementos centrais desse cenário que afeta a segurança pública dos estados, onde
Criminosos encaram o roubo como “ofício”
De acordo com Castilhone Junior, muitos criminosos, incluindo jovens e menores de idade, passaram a tratar o roubo como uma profissão.
“Ele sai de manhã, vai praticar roubo e volta para almoçar no meio da tarde”, explicou o delegado. Essa postura é acompanhada de uma crescente agressividade nas abordagens.
Casos como o do ciclista Vitor Medrado, baleado sem reagir, e do arquiteto Jefferson Dias, assassinado após tentar intervir em um assalto, ilustram a brutalidade crescente.
Em um desses episódios, o criminoso afirmou ter atirado por pensar que a vítima era policial, mostrando como a violência se tornou uma resposta “mecânica” e corriqueira.
Brechas na legislação penal estimulam reincidência
A reincidência criminal é um dos maiores desafios.
Muitos criminosos possuem inúmeras passagens pela polícia, acumulando 10, 15 ou mais casos de roubo antes de voltarem às ruas.
Segundo o delegado, dispositivos legais que permitem a progressão de regime e outros benefícios para criminosos violentos enfraquecem o efeito dissuasório das penas.
“A simples ideia de que podem voltar às ruas em pouco tempo, mesmo após tirar uma vida, compromete a segurança pública e a confiança da sociedade na Justiça”, argumentou.
Duplas de moto vêm sendo substituídas
Para evitar suspeitas, as quadrilhas têm adaptado sua atuação.
Antigamente comuns, as duplas de moto vêm sendo substituídas por criminosos que agem sozinhos ou em grupos maiores, com funções bem definidas.
Além disso, as quadrilhas passaram a compartilhar armas e outros recursos, mostrando uma interdependência dentro da cadeia criminosa.
Em São Paulo, o acesso às armas de fogo permanece uma preocupação, com rotas de contrabando garantindo que um único revólver calibre .38, por exemplo, seja utilizado em diversos crimes por diferentes quadrilhas.
Impunidade estimula agressividade dos bandidos
Castilhone Junior também destacou o aumento da agressividade dos criminosos.
Quadrilhas que utilizam motos, por exemplo, têm adotado uma postura de “tudo ou nada”.
“O indivíduo que sai com arma de fogo na cintura e aborda em via pública está disposto e preparado para confronto”, afirmou o delegado.
Essa postura reflete o desdém pela vida das vítimas e reforça a urgência de ações efetivas para conter a violência.
Redes de logística fortalecem o crime
As investigações do Deic revelaram a existência de uma complexa rede de logística que sustenta a criminalidade.
Essas redes fornecem armas de fogo, placas de veículos e equipamentos para disfarces, como mochilas de entregadores de aplicativo.
Também são responsáveis pela rápida destinação de itens roubados, como celulares e joias.
Enquanto aparelhos mais modernos são enviados ao mercado internacional, itens de menor valor são desmontados para venda de peças.
A prisão de “Mainha do Crime”, uma articuladora central em Paraisópolis, é exemplo dessa logística avançada.
Ela coordenava diversos grupos, organizando roubos em bairros de alto poder aquisitivo e oferecendo suporte logístico para as quadrilhas.
Sua captura resultou na apreensão de armas, placas, registros financeiros e materiais que contribuíram para o desmantelamento de parte da rede criminosa.
Sociedade refém do medo
Uma pesquisa recente da Quaest revelou que a violência no governo Lula é a maior preocupação dos brasileiros, superando até mesmo saúde e educação.
A sensação de insegurança é agravada por imagens de crimes violentos e pela percepção de impunidade.
Segundo o delegado, é essencial que reformas legislativas sejam implementadas para reduzir as brechas legais e restringir benefícios penais para crimes hediondos e violentos.
Castilhone Junior alerta que apenas ações coordenadas, reformas legislativas e uma atuação firme contra as redes de logística poderão reverter o cenário atual.
Enquanto isso, o desafio de combater a criminalidade enxugando gelo permanece uma prioridade, tanto para São Paulo quanto para o Rio de Janeiro.